"O que podemos aprender com a autonomia e resistência desses povos? Diante da ofensiva estatal e ruralista no México e no Brasil, como podemos nos mobilizar para apoiar esses povos? A ideia do evento é debater sobre essas e outras questões, conhecer mais sobre a luta dos zapatistas e Guarani-Kaiowá, como também pensar formas de apoio a esses povos."
Não é de hoje que os Estados nacionais buscam acabar com os índios, exterminá-los fisicamente ou ainda exterminar suas formas de vida e de pensamento. No Brasil, no México e nos diversos Estados do continente americano são claras as tentativas de silenciar os índios, seja roubando suas terras para concentrá-las nas mãos de latifundiários, seja utilizando métodos mais sutis, mas não menos brutais e eficazes.
Para mencionar a grave situação que atravessamos atualmente no Brasil, estão tramitando, no Congresso brasileiro, mais de 29 projetos que anulam ou modificam direitos indígenas conquistados ao longo de séculos de luta e hoje garantidos pela Constituição de 1988. O mais recente ataque da bancada ruralista consistiu na votação do relatório da Proposta de Ementa Constitucional 215, a PEC215, aquela que propõe transferir para o Congresso Nacional os processos de demarcação de terras indígenas. Essa proposta será encaminhada a qualquer momento para votação no Congresso. Os povos indígenas já estão se mobilizando em todo o país para exigir seu arquivamento.
Em paralelo aos ataques orquestrados pelos ruralistas no Congresso, assistimos à recrudescência da violência no campo e nas aldeias. No Mato Grosso do Sul, estado que tem a segunda maior população indígena do Brasil, cerca de 77 mil pessoas, ocorrem hoje algumas das mais graves violações de direitos indígenas: casos de tortura, estupros, espancamentos, ataques armados e assassinatos, praticados por milícias de jagunços e organizações paramilitares, contratadas por fazendeiros, ou pelas próprias forças policiais e militares, além dos altos índices de desnutrição e suicídios. Está em curso um verdadeiro genocídio, especialmente do povo Guarani-Kaiowá.
Entretanto, os povos resistem, ou melhor, “rexistem”... A Grande Assembleia Aty Guasu Guarani e Kaiowá começou na década 80 com o objetivo de fazer frente ao processo sistemático de etnocídio, a expulsão e dispersão forçada das extensas famílias indígenas do seu território tradicional. Das Aty Guasu participam hoje centenas de lideranças Guarani-Kaiowá, promovendo discussões políticas e realizando também rituais para o fortalecimento da luta. É das Aty Guasu que partiram nas últimas décadas as reivindicações de demarcação e retomadas de terras, além de denúncias e sugestões sobre possíveis soluções para o problema dos Guarani-Kaiowá.
Outro exemplo forte de resistência é o da luta zapatista. A partir do levantamento armado em 1994, milhares de indígenas maias da região de Chiapas, no México, disseram um basta à exploração que sofriam nas mãos dos latifundiários e às políticas etnocidas do Estado mexicano. Junto da retomada de terras, o movimento passou a fomentar todo um mundo autônomo (com escolas, cooperativas, atenção à saúde, etc) a partir das questões indígenas, da autogestão, quer dizer, da organização horizontal cotidiana, sem precisar recorrer ao Estado mexicano. Com isso, os zapatistas fazem também um chamado para que os povos lutem a partir de suas diferentes geografias, para, em suas palavras, viver em um mundo onde caibam muitos mundos. A autonomia zapatista construída em seus territórios é uma proposta viva de constante descolonização e ruptura com o desenvolvimentismo e a modernização capitalista. O zapatismo se tornou, então, uma das maiores encarnações contemporâneas da afirmação do antropólogo Pierre Clastres e da esquerda libertária de que é possível (e desejável) existir vida sem (e contra) o Estado e o capital, o que teve repercussões em movimentos de todo o planeta.
Os zapatistas e Guarani nos mostram que os povos indígenas ao invés de símbolo do atraso, como foram tradicionalmente colocados pelo Ocidente, podem ser, ao contrário, um futuro, já aqui-agora... Outras vidas diferentes daquelas dos homens brancos que, como dito pelo intelectual yanomami Davi Kopenawa, "vivem sem alegria e envelhecem depressa, sempre atarefados, com o pensamento vazio e sempre desejando adquirir novas mercadorias".
O que podemos aprender com a autonomia e resistência desses povos? Diante da ofensiva estatal e ruralista no México e no Brasil, como podemos nos mobilizar para apoiar esses povos? A ideia do evento é debater sobre essas e outras questões, conhecer mais sobre a luta dos zapatistas e Guarani-Kaiowá, como também pensar formas de apoio a esses povos.
Pela autonomia dos povos indígenas! Contra a PEC215 e as ofensivas ruralistas!
Mesa:
- Sandra Benites (Guarani Nhandewa e Professora)
- Tonico Benites (Guarani Kaiowá e Doutor em Antropologia pelo Museu Nacional/UFRJ)
- Luiz Eloy (Terena e Doutorando em Antropologia pelo Museu Nacional/UFRJ)
- Oiara Bonilla (Professora de Antropologia da UFF)
- Ana Paula Morel (Doutoranda em Antropologia pelo Museu Nacional/UFRJ)
- Eduardo Viveiros de Castro (Professor de Antropologia do Museu Nacional/UFRJ)
Data: 23/11 (segunda), 18 hrs, no IFCS, sala 106.
Evento no Facebook:
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